Recomendações de leitura sobre magia: parte 2 — leituras específicas
Na primeira parte deste texto, eu dei as minhas recomendações de livros para completos iniciantes e livros de base, para quem quer começar um sistema e se aprofundar, como é o caso dos livros de Damien Echols (que são excelentes para iniciantes e a partir dos quais nota-se que, aos poucos, ele está desenvolvendo um programa também), do Franz Bardon e sua iniciação hermética e os livros da Cura Prânica do Mestre Choa Kok Sui. Agora veremos algumas leituras sobre temas mais específicos: a saber, Cabala, hermetismo e magia astrológica, além de feitiçaria no geral.
A ideia aqui é oferecer sugestões para quem, pelo menos, já começou a fazer alguma coisa, por mais básica que possa ser sua prática ainda, e queira ampliar os seus conhecimentos, por exemplo, incluindo rituais planetários ou técnicas cabalísticas. Uma outra técnica interessante ainda é a magia com o tarô, mas não vou entrar nisto aqui porque já escrevi um texto inteiro tratando do assunto e sua bibliografia.
Cena clássica do filme da Branca de Neve. Eu dei uma risadinha quando lembrei desta imagem enquanto escrevia este texto, inevitavelmente.
Cabala
Eu já falei do Sepher Yetzirah, o Livro da Formação, em duas ocasiões neste site (no texto sobre as correspondências do tarô e sobre o Bardon). É um livrinho supercurto, mas denso, e tem vários sites que incluem o texto na íntegra, em inglês… porém sem alguém para nos guiar pelos segredos deste texto, fica parecendo que ele não tem nem pé nem cabeça. A grande edição de referência do Yetzirah, em inglês, é uma com tradução e extensos comentários do rabbi Aryeh Kaplan — ele próprio sendo uma figura bastante fascinante, um físico que virou rabino com interesse em Cabala e morreu bizarramente jovem. Esse volume, chamado Sefer Yetzirah: the Book of Creation, foi publicado pela Samuel Weiser, uma das gigantes do esoterismo americano… e que tem um dos comentários mais divertidos na descrição da Amazon, onde se lê que é um manual meditativo para “ajudar no desenvolvimento de poderes telecinéticos e telepáticos” (!). Essa edição foi traduzida para o português e publicada por aqui pela Editora Sêfer como Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação — Teoria e Prática, que infelizmente se encontra esgotado na editora, mas talvez dê para encontrar em sebos.
Porém, por mais que o Yetzirah seja crucial para qualquer interessado em Cabala, eu insisto no seguinte: se você quiser estudar Cabala a sério, duas coisas são importantes primeiro. A primeira é ter uma noção boa de história judaica e alguma ideia de hebraico, noções básicas de gramática (você sabia que hebraico bíblico é uma língua em que o verbo vem na frente nas frases?), vocabulário e escrita (pelo menos saber as letrinhas de cor). A segunda é ter lido bem o Antigo Testamento — ou Tanakh, ou Bíblia Hebraica, como são os termos preferidos entre os judeus. A Sêfer tem duas edições, uma só com o texto em português, na tradução de David Gorodovits e Jairo Fridlin, cuja edição física infelizmente está esgotada e só encontramos em formato e-book, e uma edição bilíngue. O texto dessas edições é meio feio, já aviso, mas tem a vantagem de não sofrer com o viés cristão que se observa em outras traduções (como incluir uma menção a Lúcifer no texto de Isaías). A Bíblia de Jerusalém também é excelente, um texto bonito e muito bem pesquisado. Para quem lê bem em inglês, serve a Bíblia online, bilíngue, do Mechon-Mamre. E eu recomendaria ainda alguns mais estudos acadêmicos sobre Cabala antes de mergulhar mais a fundo. A Cabala e o seu Simbolismo, de Gershom Scholem (ed. Perspectiva), é um clássico, que temos em tradução para o português (recomendo tudo que esse homem produziu, aliás), e An Introduction to the Kabbalah, de Moshe Hallamish, também é ótimo.
Com isso, é possível começar a estudar Cabala e não ficar tão perdido. Infelizmente, você nunca vai conseguir se aprofundar da mesma forma que um cabalista iniciado e imerso em cultura judaica, mas já dá para se orientar. Leia o Yetzirah e, se conseguir, o Bahir, que também foi traduzido e comentado pelo Kaplan. Depois você pode passar o resto da vida estudando o Zohar e seus… vinte e três volumes. Alguns desses livros é possível adquirir no site da Polar Editorial, que vem fazendo um trabalho muito interessante na área de literatura esotérica.
No tocante à parte mais prática, temos algumas opções: Meditation and Kabbalah, de — mais uma vez — Aryeh Kaplan, é uma ótima introdução a técnicas cabalísticas de meditação, inclusive ao método extático de Abraham Abulafia para conquistar dons proféticos; depois temos o incrível grimório cabalístico medieval Brit Menucha, de Avraham ben Yitzchak, que inclui trechos sobre conjuração de anjos, mas infelizmente, eu confesso, é avançado demais para mim; e, na frente mais praticável, mas ainda puramente cabalístico e, creio, legítimo (sem cair na Cabala da Golden Dawn), eu recomendo o Qabbalistic Magic: Talismans, Psalms, Amulets, and the Practice of High Ritual, de Dolores Ashcroft-Nowicki e seu estudante Salomo Baal-Shem, que inclusive tem um capítulo muito bom de magia com salmos. Nesse sentido também, Jacobus Swart, discípulo de William Gray e cofundador da ordem Sangreal Sodality, tem uma série de livros chamada de “Shadow Tree Series”, composta pelos volumes The Book of Self Creation, The Book of Sacred Names, The Book of Seals and Talismans e The Book of Immediate Magic. Esses livros são um tesouro para qualquer um interessado no assunto, porém são meio inacessíveis, tanto por serem caros e não ter edição brasileira quanto pelo fato de que mesmo os PDFs que se encontra por aí são incompletos.
O Sepher HaRazim, Livro dos Mistérios, de que eu falei no texto sobre magia angelical, é um outro livro protocabalístico e um grimório fascinante, que também vale a pena estudar, mesmo que seus rituais não sejam praticáveis (tradução e comentário em inglês de Michael Morgan).
Isso tudo, é claro, é se você quiser estudar Cabala judaica. A Cabala hermética da Golden Dawn e da Thelema, a meu ver — verdade seja dita — não é tão profunda. O Chicken Qabbalah do Lon Milo Duquette, um livro cujo título deixa claro já o teor engraçadinho que é típico do autor, faz um ótimo trabalho em resumir e explicar os fundamentos das partes da Cabala judaica usadas pelos ocultistas ocidentais junto com as discussões que são mais unicamente deste grupo, como Cabala e tarô. Sua grande vantagem é que é um livro de linguagem ridiculamente acessível, como costumam ser os livros do Duquette. Um pouco mais sério, o Maat Magick, da Nema, que eu recomendei no texto anterior, cumpre um propósito semelhante de guiar o neófito pela Árvore da Vida da Thelema. E, claro, A Cabala Mística da ilustre Dion Fortune é um clássico do gênero, mas, por favor, leia com um grão de sal. Como ela admite, ela não sabe quase nada de hebraico e toda a parte de comentário histórico do livro reflete o que se sabia na época, fora dos círculos mais fechados da academia. Mantenha em mente que tudo o que um ocultista diz sobre Cabala, apesar do floreio judaico, só se aplica à Cabala hermética. O entendimento de Fortune sobre Netzach e Hod, por exemplo, como respectivamente “Vênus, o raio verde da natureza, força elemental, iniciação das emoções” e “Mercúrio, Hermes, a iniciação do conhecimento” não tem nada a ver com o entendimento de um cabalista judaico como o rabbi Jay Michaelson, nem com um exercício muito grande de abstração.
Para quem preferir estudar isso diretamente comigo, eu devo ministrar um curso básico sobre as noções por trás da Cabala (e as diferenças entre Cabala judaica e ocidental) em breve. Fiquem de olho aqui na aba de cursos do site.
Hermetismo
Eu preciso avisar logo de cara que eu não sou fã do Kybalion. Quando falam em “leis herméticas”, geralmente é isso que se tem em mente, a lista das 7 leis dadas nesse volume, mas o Kybalion não é exatamente representante da tradição, haja vista que o grosso do seu pensamento deriva da corrente do New Thought, haja vista que seu provável autor William Atkinson foi um dos pioneiros desta escola. Como já disse, eu fico muito dividido no que diz respeito a esse livro, em parte porque eu mesmo não gosto e o Sam Block, outro autor que já ficou claro que eu admiro aqui, não suporta… porém um bom amigo que é também um astrólogo e magista muito mais experiente do que eu, a quem eu admiro ainda mais, faz ótimo uso dele e seria inútil lutar contra a influência desse livro. Talvez seja melhor falar num hermetismo clássico e num hermetismo moderno ou neo-hermetismo, influenciado por outras correntes, que assim podemos traçar uma divisão histórica razoável sem ofender ninguém. Franz Bardon, afinal, que todos sabem aqui que é uma imensa influência sobre as minhas práticas, também não é um hermetista clássico. Ambos os autores, para dar um exemplo, são reticentes quanto à questão devocional, que é um elemento importante dos textos antigos.
Para entender o hermetismo então (e até mesmo poder observar no que esses textos modernos se aproximam e se afastam dos clássicos), eu recomendo voltar às raízes da coisa, e o melhor ponto de partida é o chamado Corpus Hermeticum. Esse nome se refere a um apanhado de textos atribuídos ao lendário sábio Hermes Trismegisto, reunidos e publicados em tradução para o latim pela primeira vez pouco antes de 1500, por obra de Marsilio Ficino. Na época, a edição de Ficino contava com quatorze textos, incluindo os mais famosos como “Poemandres” e “Asclépio”, e uma edição posterior, de 1641, acrescentou mais um tanto, ainda que vários estivessem num estado fragmentário. Em inglês, a tradução mais consagrada é a do pesquisador Brian Copenhaver, que também conta com uma boa introdução e notas. Em português, a Polar Editorial tem um belo volume na tradução de Américo Sommerman.
Todo o material atribuído a Hermes é chamado de Hermetica, mas o Corpus Hermeticum não representa todo esse material. Há ainda alguns outros fragmentos e textos avulsos, incluindo a Tábua de Esmeralda, um texto bastante tardio, datado já do período islâmico, mas imensamente influente. Para esses casos, recomendo um livro chamado Hermetica II: The Excerpts of Stobaeus, Papyrus Fragments, and Ancient Testimonies in an English Translation, editado por David Litwa. Uma coisa que deve-se manter em mente ao ler a Hermetica é que não se trata de um todo coeso e muitas obras estavam incluídas numa discussão viva e mais ampla (que infelizmente se perdeu), de modo que os vários autores tinham uma compreensão e agenda próprias que buscavam promulgar. Por isso é crucial a perspectiva crítica ao longo desse processo.
E, claro, como dito no texto sobre os PGM, uma outra recomendação é ler a edição de Hans Dieter Benz dos Papiros, bem como o Ancient Christian Magic, que fornecem a parte prática da magia hermética da Antiguidade (em contraposição aos textos da Hermetica que representam a doutrina elaborada filosoficamente).
Evite qualquer coisa que chame Hermes/Thoth de “Atlante” que é 100% de garantia de ser bobajada New Age.
Magia astrológica
Quem me lê (e especialmente quem fez o meu curso) sabe que esse é um assunto de que eu gosto muito. E a bibliografia aqui é bastante vasta, mas eu serei breve.
Não podemos falar em magia astrológica sem mencionar 1) a obra de Agrippa, mas que eu já citei no texto anterior e 2) o grande compêndio de magia árabe medieval que é o Picatrix (originalmente Ghayat al-Hakim, “O Objetivo do Sábio”). Entre as suas inúmeras receitas de magia imagética, invocações, sigilos e caracteres mágicos, trata-se de uma leitura indispensável na área. A obra é anônima, atribuída ao astrônomo e matemático Maslama Al-Majriti, apesar de essa atribuição ser problemática por uma questão de datação. Como resultado do contato belicoso entre o mundo árabe e espanhol durante o medievo, o livro chegou à Europa por volta de 1200, sendo traduzido primeiramente para o espanhol, sob ordens de Alfonso X de Castilho, e depois para o latim — mas há diferenças substanciais entre as versões árabe e europeia. Por isso geralmente fala-se num Picatrix latino e num Picatrix árabe, à parte. Para o primeiro, temos a tradução do Christopher Warnock, em colaboração com o também grande John Michael Greer, para o inglês (disponível no Internet Archive, num pacote com muitos outros livros) que eu recomendo. Para o segundo, infelizmente a única edição disponível de que eu tenho notícia é a do Hashem Atallah cujo inglês é quase ininteligível. Vale a pena ser consultada para ter uma ideia das coisas, mas é uma leitura muito frustrante.
E falando em Warnock, ele não é apenas um tradutor desse tipo de material, mas um astrólogo que pratica exclusivamente a modalidade clássica da astrologia e toca o site Renaissance Astrology. E, claro, ele orienta as suas práticas mágicas por essa vertente também. Seu Secrets of Planetary Magic é um ótimo ponto de partida para quem tem interesse no assunto (de quebra, o ebook está 10 reais na Amazon ou de graça pelo Kindle Unlimited) e ele é autor de um livro apenas sobre magia com as estrelas fixas (um assunto sobre o qual é um pouco difícil de encontrar material, além daquilo que se vê em Agrippa ou Ficino) que é o Fixed Star, Sign and Constellation Magic. Recomendo muito também a leitura do blog dele.
Um outro autor interessante é o Rufus Opus, que escreveu Seven Spheres, um programa de autoiniciação pelas esferas planetárias, à moda hermética. Nele, ele ensina o leitor a conjurar os arcanjos dos 7 planetas para buscar uma iniciação com cada um deles, criando talismãs no processo que fornecem um grande poder de desenvolvimento mágico. Eu acho muito divertido que ele entende o magista como um tipo de rei e cada talismã modifica, aperfeiçoa e amplia um pouco o seu reino. É essa mais ou menos a perspectiva a partir da qual ele parte e o livro é interessantíssimo. Ele também desenvolve, o que é digno de nota, uma variação do triângulo de evocação de Trithemius que substitui os reis demoníacos dos quatro ventos pelos quatro arcanjos, o que todos devem concordar que é mais adequado à magia angelical.
Por fim, tenho mais dois livros de que eu gosto e que são úteis especialmente para quem busca um modelo mais fechado para praticar magia planetária, pois trabalham com rituais ligados ao heptagrama, a estrela de sete pontas. Na magia planetária nos moldes da Golden Dawn, utiliza-se um ritual chamado Ritual Maior do Hexagrama para invocação planetária… porém, considerando seu uso de Cabala hermética e certas complicações práticas, trata-se de uma técnica que eu não recomendo para iniciantes a não ser para quem realmente gosta desse sistema1. Nesse caso, eu recomendaria o Practical Planetary Magick, da Sorita D’este e do David Rankine, que é acessível e oferece um ritual planetário bastante praticável, bem como vários outros comentários úteis sobre os arquétipos planetários, os espíritos do Arbatel e tudo o mais. Para quem tem um pouco mais de experiência e/ou leitura no assunto, o Planetary Magick: the Heart of Western Magick da Melita Denning e do Osborne Phillips, da Aurum Solis, oferece um outro modelo de ritual, também centrado no heptagrama, mas mais complexo, bem como vastas quantidades de material para trabalho planetário.
Miscelânea
Nesta seção agora eu falo de alguns autores que ensinam formas muito variadas de magia, não estando limitadas a um sistema ou um vocabulário simbólico único. Meu primeiro contato com esse tipo de livro foi o High Magic do Frater U.D., onde aprendi a fazer magia planetária via Ritual do Hexagrama. Nos dois volumes de High Magic, ele ensina a lidar com sigilos, magia elemental e planetária, magia popular, magia bíblica, criação de talismãs e até mesmo Goetia, além de incluir vários exercícios úteis e algumas anedotas divertidas. Eu confesso que não me agrada mais a sua abordagem teórica — hoje discordo de muita coisa que ele diz, inclusive—, e seu registro às vezes tem um pouco daquela empáfia que ninguém mais aguenta em ocultistas, mas não posso negar o impacto que este livro teve para ampliar minhas práticas quando eu estava começando e imagino que possa ser muito útil para outros iniciantes.
Uma outra recomendação são as obras do Jason Miller. Miller é O Cara da magia dos resultados (vulgo feitiçaria) e, ao longo de décadas, ele vem estudando todo tipo de tradição mágica, da magia cerimonial e da bruxaria ao Hoodoo, e então foi iniciado nas tradições do budismo esotérico (Vajrayana) no Nepal. Como diz o nome do seu site, Strategic Sorcery, sua ênfase é na aplicação estratégica de magia prática para mudar o que você quer na sua vida. O Jason fala um pouco de teoria em seus livros, mas não é pesado, e ele tem um estilo facílimo de acompanhar. Em The Sorcerer’s Secrets, ele ensina uma série de técnicas que combinam com quase qualquer tradição que você siga, abrangendo um campo vasto de áreas de interesses: magia financeira, magia amorosa (não amarração), magia para limpeza e proteção, magia para sucesso no geral. Em Protection and Reversal Magick: A Witch’s Defense Manual ele se aprofunda em defesa e proteção, ensinando de tudo desde métodos para descobrir se você realmente está sob ataque até rituais de banimento (com uma pegada hecatiana) e mojo bags. Em Financial Sorcery ele se aprofunda em magia para dinheiro, não apenas ensinando as técnicas, mas também falando sobre a melhor forma de aplicá-las em conjunto com as suas abordagens mundanas, como eu já comentei antes. E por aí vai. Meu único problema com o Jason é que às vezes ele é americano demais (e, como tal, parece que ele está sempre a um passo da autoajuda ou do coaching, ao mesmo tempo em que fala muito pouco de práticas propriamente espirituais) e isso incomoda, mas, como eu gosto das ideias dele no geral, eu acabo relevando.
E aí temos o Patrick Dunn. Eu posso ser acusado de que minha simpatia por ele seja, em parte, corporativista: como alguém com doutorado em Letras, é muito bom ver outro magista que também vem desse background. A abordagem de Dunn sobre magia gira em torno da questão da simbologia mágica, que ele trata de uma perspectiva ao mesmo tempo como magista e linguista. A partir daí, vocês podem imaginar que seus livros têm uma carga razoavelmente pesada de teoria. Ele nunca é críptico, não tem nada como se vê no Crowley, mas ele trata de umas questões cabeludas. Assim como o Jason, ele tem um livro de teor mais geral, o Postmodern Magic: the art of magic in the information age, seu primeiro livro, de 2005, e outros mais específicos. Apesar de o nome poder fazer as pessoas torcerem um pouco o nariz, pois pode levar ao entendimento errôneo de que se trata de um livro meio bunda-lelê, Postmodern Magic tem muita coisa útil, incluindo um capítulo sobre oráculos, ferramentas mágicas, um “bestiário” sobre os vários tipos de seres do mundo oculto, de deuses a servidores e pragas astrais, técnicas para contato com o Sagrado Anjo Guardião e dicas para lidar com grupos de magistas (o “networking oculto”).
De 2008, Magic, Power, Language, Symbol mergulha mais a fundo nessas questões de simbolismo; Cartomancy with the Lenormand and the Tarot: Create Meaning and Gain Insight from the Cards, de 2013, é uma introdução ao baralho cigano (Petit Lenormand) e ao Tarô e à adivinhação em geral, com umas dicas para construir um método próprio de cartomancia (um assunto que também é tratado em Spare). Já The Practical Art of Divine Magic: Contemporary & Ancient Techniques of Theurgy, de 2015, é o meu favorito, sendo um livro bem aprofundado sobre teurgia, as práticas mágicas de elevação espiritual centradas no trabalho com divindades. Em 2018, com The Orphic Hymns: a New Translation for the Occult Practitioner, ele também publicou uma tradução para o inglês dos famosos hinos órficos com um ênfase específica para ocultistas.
Por fim, claro, não posso deixar de mencionar, mais uma vez, o projeto Arte e magia do caos: obra reunida de Austin Osman Spare, organizado pelo Rogério Bettoni e pela Oficina Palimpsestus, que está no catarse no momento, com quase 50% do projeto já financiado. Como dito no texto, este volume reúne toda a obra escrita e visual disponível de autoria desse grande ocultista e artista inglês. Spare não é o tipo de autor que pega na sua mão e te guia pelo seu sistema, mas, como todos já tivemos algum contato com suas técnicas, haja vista que a magia dos sigilos foi plenamente incorporada pela Magia do Caos, poder voltar às origens e ler tudo como foi concebido pelo autor (e com acompanhamento crítico) é crucial, eu acredito, e leva a insights interessantíssimos.
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[1] Na lógica de se traçar símbolos no ar que permeia também o Ritual do Pentagrama, utiliza-se o Hexagrama nesse rituais para representar os sete planetas. Cada uma das pontas representa um planeta e então ao se desenhar o hexagrama adequado no ar utilizando os nomes divinos apropriados, é possível invocá-los… a grande complicação é que são 7 planetas e apenas 6 pontas, o que dificulta a invocação do Sol, haja vista que exige fazer todos os outros 6 em sequência. Essa complicação é eliminada em métodos que utilizam estrelas de 7 pontas, em vez de 6… mas a oposição entre o pentagrama microcósmico e o hexagrama macrocósmico, cujas pontas inclusive descrevem a posição dos planetas na Árvore da Vida, é parte integral, hardwired, por assim dizer, do sistema da Golden Dawn.