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Primeiros passos com o tarô

Primeiros passos com o tarô

Leitura em 22 min
Fonte: O Zigurate

Então você decidiu que vai aprender tarô. Ótimo! Mesmo que você não pretenda atender profissionalmente em algum momento do futuro, todo mundo pode se beneficiar do domínio de um método divinatório, especialmente se já pratica magia. É uma mão na roda ter uma ferramenta assim para se comunicar com forças incorpóreas e avaliar se uma nova prática que parece interessante vai ser eficaz e adequada para você, e o tarô é, de longe, o método divinatório mais popular no Ocidente. Agora, se você ainda não tem uma prática mágica, o tarô também pode ser uma excelente porta de entrada… além de ter suas óbvias aplicações mais mundanas.

Eu reconheço que não sou um tarólogo tão bom quanto alguns de meus pares (vide o pessoal que eu indico na página de recomendações do site), mas entendo o suficiente para poder ajudar o iniciante. Este texto, portanto, eu escrevi pensando na situação bastante comum das pessoas que têm interesse em tarô — seja como ferramenta para autoconhecimento, para inspiração artística ou para fazer previsões — , mas ainda não sabem por onde começar. É um passo a passo bem simples, acredito, para facilitar esse processo, que pode parecer bastante intimidador quando a gente está começando. Afinal, tem muita informação para se processar — tanto informações legítimas quanto crendices — , e acho que ajuda ter alguém para mastigar isso.

A Sacerdotisa (ou talvez o Papa? Parece uma imagem meio mista, a julgar pelo fundo e as chaves) no vídeo que a Dior fez para anunciar sua coleção primavera-verão 2021. A indústria da moda é, como bem sabemos, uma coisa bastante escrota e não é de hoje que o pessoal vai procurar se apropriar do fato de que o misticismo no geral é uma tendência atual, mas preciso admitir que esse trabalho ficou impressionante.

O que eu não vou tratar aqui é da história ou da estrutura do tarô. Eu pressuponho que todo mundo já tem alguma familiaridade com a ideia dos 22 arcanos maiores, os 56 arcanos menores, os naipes, etc. e eu também falo um pouco disso num texto anterior sobre como escolher um oráculo. A ideia aqui é que este texto sirva como um guia prático.

1º passo — Escolher o baralho

A primeira parte já é bem difícil. Se você abre um site como o da loja Simbolika, você vai ver que existe uma variedade vertiginosa de baralhos. Logo na primeira página, tem pelo menos três tarôs de inspiração africana ou afro-americana, o Ancient Italian Tarot, um tarô gótico, um tarô com artes inspiradas em Jerônimo Bosch, um tarô de gatinhos, um tarô de inspiração egípcia… comprar um desses tarôs, assim, sem mais nem menos, arrisca dificultar o processo de aprendizado, por isso é importante saber um pouco sobre a estrutura dos baralhos antes.

A questão é que, apesar dessa variedade imensa, na real os grandes baralhos principais são apenas três — inclusive é assim que um site como o Aecletic.net faz a divisão: Marselha, Rider-Waite-Smith (RWS) e Thoth (mais uma possível quarta categoria de versões mistas). Existem alguns outros, menos conhecidos, como o Sola Busca, mas vamos ficar com esses para simplificar.

O Marselha se tornou, no séc. XIX, o principal padrão dos tarôs mais antigos, sendo um dos poucos que sobreviveram dentre os baralhos renascentistas. Foi este o baralho com o qual Éliphas Lévi e Papus trabalharam quando traçaram suas correlações entre tarô e Cabala na época, o que despertou o interesse de tantos outros ocultistas. Dentre baralhos mais modernos, o criado por Oswald Wirth (1860 – 1943), por exemplo, se baseia no de Marselha, com a interpretação cabalística de Lévi.

Depois tem o RWS, publicado em 1909, uma criação de dois membros da Golden Dawn, Arthur Edward Waite, que concebeu as ideias e símbolos das imagens, e Pamela Colman-Smith, que ilustrou tudo com seu estilo peculiar e imediatamente reconhecível. O sucesso do RWS foi tremendo e estabeleceu o padrão do tarô para praticamente todas as outras variações de fantasia que vieram depois. Por isso, se você comprar um tarô como o Tarô Mitológico, o Morgan Greer ou o Modern Witch, pode ter certeza que o que você vai receber é uma outra skin, por assim dizer, do RWS, com talvez algumas variações, mas nada que destoe demais1. Sua grande inovação, apesar de não ser o único a fazê-lo, foi ter ilustrado os arcanos menores, de modo que uma carta como dois de copas, por exemplo, vai representar uma cena associada à sua interpretação e não literalmente duas taças (cups, copas). Copas é o naipe associado ao elemento da água (por isso emoções, intuição, etc.) e o 2 aponta para um encontro, por isso 2 de copas é um arcano do amor e da união. Esse é o motivo pelo qual eu prefiro recomendar o RWS e variantes, mais do que o Marselha, para iniciantes que não tiverem um domínio de outras práticas de cartomancia.

A outra versão é o chamado Tarô de Thoth, concebido por Aleister Crowley e ilustrado por Frieda Harris. Apesar de Crowley assumir os créditos (como sempre…), especialmente por ter trocado os nomes de alguns arcanos para combinar melhor com o novo éon (tipo Justiça que vira Ajustamento), ele não bolou tudo sozinho e boa parte dos significados aqui derivam de um documento chamado Book T da Golden Dawn, elaborado por Samuel Mathers. E o doido é que, apesar de Waite também ter sido um membro da ordem e ter se valido de influências hermético-cabalísticas, ele se desvia bastante dos moldes delineados no Book T — talvez pelo fato de o Waite considerar Mathers um idiota. Isso se observa na diferença de um arcano menor como o 7 de ouros, que o RWS apresenta positivamente, como uma carta associada a colheitas, ao passo que o Thoth o entende como “Fracasso” — em ambos os casos há algum sentido em comum entre as duas cartas, colheita e fracasso são conceitos relacionados, pois dizem respeito aos resultados das nossas ações, mas é uma diferença bastante significativa.

Outra variação importante se observa nas cartas de corte: o Marselha e o RWS usam o padrão clássico valete (também chamado de pajem) — cavaleiro — rainha — rei. Já o Book T usa princesa — príncipe — rainha — rei. Um exemplo de um tarô, além do Thoth, que usa esse padrão é o belíssimo baralho da Barbara Walker.

Com isso em mente, é possível fazer uma escolha um pouco mais qualificada na hora de selecionar o seu baralho, em vez de se orientar só pelo que você achar mais bonito. Digo, não que a estética não seja importante. Tem um baralho absolutamente medonho, o Arcanum Tarot, cujas imagens parecem capa dos antigos livros da Martin Claret, que eu mesmo não conseguiria usar. Mas saber o que você está comprando é importante para evitar surpresas. A minha recomendação é que você comece ou com o RWS (de preferência as versões “original” ou “oficial” que são mais bonitinhas… eu evitaria a “universal”) ou alguma de suas variantes. O Marselha tem o obstáculo de não ilustrar os arcanos menores, já as variantes Book T/Thoth costumam incluir muitas referências astrológicas e cabalísticas, que também podem ser um pouco demais para o iniciante.

Pelo amor de DEUS

No entanto, como dito, a estética é importante. Eu recomendo que você procure um baralho que realmente entre em sintonia contigo — eu sou meio mão de vaca, então o RWS padrão, mais comum e barato, já entrou em ressonância horrores, mas se você se deparar com um tarô belíssimo e sentir que quer muito trabalhar com ele, vai fundo. Só tente entender antes qual a linhagem da qual ele deriva para não se sentir perdido depois. Não existe nenhum baralho específico com o qual o iniciante precise começar.

Caso queira saber um pouco mais sobre as diferenças entre o Marselha, o RWS e o Thoth em termos de como é feita a interpretação do jogo nesses baralhos, temos um outro texto sobre esse assunto aqui, comparando um mesmo jogo de arcanos menores nessas três versões.

O que recomendo evitar só são os baralhos chamados de oráculos que não são tarôs — afinal este texto é sobre tarô e não sobre baralhos de oráculo, que podem ter qualquer formato. Para um baralho ser um tarô, ele precisa ter uma estrutura com 22 arcanos maiores baseados na sequência O Louco, o Mago, etc., até o Mundo, junto com 56 arcanos menores, que incluem as cartas de 1 (ás) a 10 de cada naipe, equivalentes aos quatro elementos, mais as quatro cartas de corte. Alguns tarôs podem ter uma ou outra carta a mais e alterar um pouco algumas coisas, mas não dá para desviar muito disso… o que é complicado, porque existem baralhos que se vendem como tarôs, mas que é difícil de chamar assim, tipo o “tarô Zen do Osho”, que eu realmente não recomendo. Isso não significa uma desvalorização desses baralhos, mas o tarô é uma linguagem e fica impossível você entender como outros tarólogos, mais experientes, interpretam o Imperador e o Papa, por exemplo, se você tem um baralho que chama esses arcanos de “The Rebel” e “No-thingness”. É outro jogo totalmente.

E, não, aquela bobagem de “o seu primeiro tarô você tem que ganhar” é isso mesmo, bobagem. Não sei quem inventou essa crendice, mas é absurdo como esse tipo de coisa ganha espaço e as pessoas repetem sem refletir. Não vai acontecer nenhum desastre se você comprar o seu tarô pessoalmente.

2º passo — Limpar e consagrar

Certo, você já comprou o seu tarô, e agora? Já pode começar a jogar?

Há quem diga que não tem problema, mas eu prefiro uma abordagem um pouco mais ritualística. Eu entendo os baralhos como ferramentas mágicas e, como toda ferramenta mágica, eles precisam passar por um processo de consagração. A consagração está para o objeto como a iniciação para o magista: é a passagem de um estado para outro, saindo do mundano para um nível mais elevado, onde vai começar a desenvolver seu potencial mágico. Esse processo também liga a ferramenta a você e permite, com o tempo, fortalecer os laços entre os dois, o que vai aumentar a precisão das respostas.

Antes disso, porém, eu recomendo dar uma limpada no baralho. Energia, como se sabe, é contagiosa, e os objetos pegam as energias do ambiente, por isso o seu baralho vai vir já com algumas sujeiras acumuladas no processo de fabricação, manufatura e venda. Mas não é nada de mais também, não precisa se alarmar, até porque o papelão não é o material mais poroso para isso (cristal é bem mais chato). Você espalhar as cartas sobre o seu altar e combinar os dois rituais de banimento da Golden Dawn, o do Pentagrama e do Hexagrama, ou acender um incenso de qualidade de olíbano ou lavanda e passar as cartas por alguns segundos sobre a fumaça já basta. E aí também dá para emendar um ritual de consagração na sequência. Outra opção, mais preguiçosa, é simplesmente deixar o seu baralho durante uma horinha exposto a um fone de ouvido tocando um mantra como OM. 

O tarô de Barbara Walker, de que falamos acima

E, não, colocar uma pedra do lado não vai limpar as cartas por si só — as pessoas precisam parar com essa ideia de que as pedras realizam aquilo que a gente deseja sozinhas. É possível sim limpar com pedras, mas a pedra precisa ser limpa e consagrada previamente, e então programada para isso. Não vá me botar uma selenita recém-comprada da loja do lado do baralho, porque as pessoas dizem que selenita limpa. Desse jeito assim, nesse caso, provavelmente você vai é sujar as coisas. Quem quiser saber como fazer isso, o livro de Autodefesa Psíquica do Mestre Choa Kok Sui é excelente e ensina a programar um cristal para agir como um “aspirador de pó psíquico”, puxando a sujeira e lançando-a a um receptáculo com água e sal.

Agora, quando eu falo em ritual de consagração, também não precisa ser nada muito elaborado. Acende uma velinha, faz o seu ritual preliminar de sempre, põe o baralho na mão, visualiza umas luzes e recita um breve textinho em que você invoca os poderes com os quais você se relaciona (Deus e nomes divinos, deuses, seu dáimon pessoal, seus guias, os poderes dos quatro elementos) e pede para abençoarem as cartas e algo do tipo “que elas digam sempre a verdade” ou coisa assim. As antigas preces divinatórias babilônicas concluíam com a frase ina ikrib akarrabu kitam shuknam, i.e., “nesta prece que eu faço, colocai a verdade”, e eu acho uma boa ideia incluir essa intenção, ainda que não necessariamente com essa formulação, claro. Não precisa ser nada muito longo e pomposo, mas é importante que faça sentido para você e que, por isso, você faça com atenção e vontade. Se você tem alguma afinidade com o sistema da Golden Dawn, eles atribuem ao tarô um anjo chamado HRU que trata de tudo ligado às cartas e pode ser invocado nesse momento (para mais informações, conferir o livro Tarot Talismans, do casal Cicero). De novo, temos também um texto só sobre a prática da consagração do baralho, aqui.

Agora a questão da limpeza é importante não tanto nesse momento inicial, até porque não é como se editoras, gráficas e livrarias fossem matadouros ou cemitérios para o baralho vir assim tão sujo. O crucial é que você pegue o hábito de limpeza, não só do baralho, como também do seu campo pessoal, especialmente se você for tirar cartas para outras pessoas. Esse processo, como tudo, é uma troca de energia e, mesmo atendendo a distância, você acaba pegando a sujeira das pessoas. É meio inevitável, mas fácil de resolver. A Josephine McCarthy, na segunda lição da Quareia, sobre tarô, recomenda lavar as mãos com água e sal depois de atender e, de vez em quando colocar o baralho num saco com sal (o que é uma recomendação que eu acabo não endossando), mas você pode também recorrer a defumações, ao Ritual Menor do Pentagrama e equivalentes e ao OM no fone de ouvido. Mas é importante você fazer alguma coisa, senão a sujeira acumula e pode não apenas viciar o baralho, comprometendo sua precisão, como também trazer todo tipo de mal estar associado a um corpo energético sujo.

3º passo — Conectar-se com o baralho

Maravilha, você já tem o seu próprio baralho, devidamente consagrado. A minha recomendação na sequência é reservar um tempo, todos os dias, para curtir as cartas. Pegue as cartas, embaralhe, admire a ilustração. Olhe as imagens de perto, preste atenção nos detalhes, no simbolismo. Repare no que mais fisga o seu olhar, na impressão emocional que cada imagem causa. Esse é o primeiro passo para se aprender a jogar o tarô.

As cartas do baralho do Dalí. É necessário fazer muita magia de prosperidade para se conseguir um desses

Uma grande vantagem do tarô como sistema divinatório, em oposição a outros sistemas como runas e geomancia, que se valem de símbolos mais abstratos, é que é possível, pelo menos até um certo grau, ler as cartas intuitivamente. Ao olhar uma carta como o Imperador, você consegue abstrair daí uma noção de poder e imponência que de fato faz parte da interpretação do arcano. Já a Sacerdotisa tem uma aura mística, você enxerga nela uma figura capaz de acessar os mundos interiores e que pode iniciá-lo também, se você souber prestar atenção; o Diabo transmite uma sensação de aprisionamento, com as duas figuras acorrentadas. Da Torre, então, eu nem vou falar nada. E assim vai. Observe também as possíveis ligações entre os arcanos: em quais cartas podemos ver figuras que estão de armadura? E quais estão nuas? Quais são as estruturas, posições e símbolos que se repetem de um arcano para outro? No RWS, famosamente, o Diabo repete a pose do Mago, por exemplo, ao mesmo tempo em que as figuras humanas ali representam uma paródia do que vemos no arcano dos Amantes. Esse tipo de detalhe é muito interessante e serve para ocupar a sua mente com o tarô.

Se você ainda não sabe os significados das cartas, então comece, claro, pelos arcanos maiores. Você pode escolher um arcano por dia para estudar a fundo e tentar entender seus significados e associações. Tendo dominado os arcanos maiores, você já pode começar a fazer jogos simples, e depois ir aprendendo os menores, que dão um pouco mais de trabalho pela quantidade de cartas, mas cujo significado é também mais óbvio no geral se você estiver jogando o RWS ou uma variante.

Procure um bom livro sobre o assunto, o estude. Algumas recomendações de autores incluem: Nei Naiff, Rachel Pollack (sua Bíblia Clássica do Tarot saiu recentemente em português pela Darkside), Susan T. Chang, Josephine McCarthy. Mas não fique com a impressão de que precisa ler tudo que existe sobre o tarô, até porque não é raro que os autores discordem entre si. Essa discordância, no entanto, não deve ser entendida como um grande problema, tipo “ah, vou jogar tudo pro alto, nada aqui faz sentido”. A questão é que você deve ter uma ideia do significado geral das cartas e então ir construindo, na sua relação com o tarô, seus significados mais pessoais. Os livros e sites podem falar o que um dado arcano significa de modo geral, seus sentidos positivos e negativos, para saúde, finanças, amor, como conselho, etc., mas nunca vão exaurir todos os contextos e interações possíveis. Esse tipo de percepção a gente só desenvolve na prática.

4º passo — Começar a jogar

Primeiramente, você precisa embaralhar o seu tarô. As primeiras embaralhadas dão um pouco mais de trabalho, porque o baralho costuma vir ordenadinho e fica difícil fazer uma leitura decente se as cartas estão saindo em sequência. Se as cartas forem muito grandes e ruins de embaralhar, você pode separá-las também em bolos e aí depois misturar. Mas nessa hora também há algumas decisões a serem tomadas:

1) Misturar ou separar arcanos maiores e menores?

As duas possibilidades aqui oferecem nuances distintas de significados. Quando misturamos os arcanos todos, o número de arcanos maiores que saem num jogo se torna significativo, até porque eles nem sempre vão aparecer. Se você faz um jogo de 6 cartas, por exemplo, e quase todas são arcanos maiores, é porque tem algo muito poderoso em jogo aí. Se não saírem tantos arcanos maiores, então essa questão acaba sendo um pouco mais branda, mas as posições em que esses arcanos saem são posições de destaque. Agora, se a gente separa os arcanos, é possível fazer jogos apenas com arcanos maiores ou jogos em que, para cada posição, você joga um arcano maior e um arcano menor — esse é o chamado “método europeu”, aliás, em que o arcano maior vai descrever o xis da questão, enquanto o menor vai dar nuances. Cada método vai ter as suas vantagens, por isso é importante experimentar com eles e ver qual é mais útil para você. Se você se der bem com os dois, pode ser interessante ter dois baralhos para facilitar o seu trabalho e não ter que ficar separando e misturando os arcanos maiores com os menores toda vez.

2) Usar cartas invertidas ou não?

Eu toco nesse assunto agora porque, para se usar técnica da carta invertida, primeiro é preciso embaralhar prevendo a possibilidade de inversões — essa é mais uma variável a ser contabilizada. Geralmente cartas invertidas encarnam a versão negativa de uma carta, mas alguns leitores entendem a inversão como, de fato, um sentido contrário, por isso cartas que pendem para o negativo, ao serem invertidas, poderiam se tornar mais brandas também. Mas isso varia muito de tarólogo para tarólogo. De novo, o importante é o método fazer sentido para você. Nem todo mundo usa cartas invertidas (eu não uso), e autores como a Josephine McCarthy são da opinião de que é possível transmitir esses significados negativos por meio da posição da carta num jogo e pela sua relação com as outras cartas, mas não há, nem de longe, um consenso geral.

Ufa. E é isso. Se você não quiser pensar muito, o default é jogar sem inversões e misturando os arcanos, mas é bom saber que tem opções.

Agora sim!

Outra das vantagens do tarô é que ele oferece possibilidades infinitas de tiragens, mas algumas são mais fixas e consagradas, por isso são úteis para iniciantes. A mais tradicional é a tiragem de 3 cartas, em que você tira, da esquerda para a direita, cartas para o passado, presente e futuro. Ou então você posiciona no centro uma carta que resume a questão, com outra representando os aspectos positivos na direita e uma terceira com os aspectos negativos na esquerda. Ou ainda você tira uma única carta principal e outras duas de nuance, então observa como elas dialogam, somando os seus significados de maneira intuitiva. 

Para dar um exemplo, se você quiser saber de um relacionamento com esse último método e tirar a Torre como carta principal, acompanhada de um 7 e um 3 de espadas como nuances, temos aí um sinal claro de que esse relacionamento não vai durar — ele está desmoronando — , provavelmente por conta de traição.

E, claro, tudo isso pode ser combinado: uma carta para resumir a questão, duas de nuance, mais outras duas para pontos positivos e negativos, mais uma para passado, outra para futuro e, já que estamos aqui, joga ainda uma carta de conselho. Voilà, você já tem aí um jogo de 8 cartas (16 se fizer o método europeu). Bastante complexo, mas sem grandes complicações.

Para o ato da tiragem em si, você pode ter uma postura mais ou menos ritualística — aí vai de cada um. O meu costume é trabalhar por meio de sessões, em que eu acendo uma vela, talvez um incenso, abro a toalhinha e recito uma prece antes de fazer a tiragem (sobre a ritualística, eu discuto a questão de modo mais aprofundado aqui). Na sequência eu faço a minha pergunta em voz alta enquanto embaralho as cartas, então corto o baralho, coloco as cartas, cada uma em sua posição, viradas para baixo, agradeço e viro todas para cima. Esse método é talvez cheio de pompa demais, mas funciona e é o que é confortável para mim. Cada pessoa deve desenvolver um ritual próprio para jogar o tarô que combine com o seu modo de trabalhar no geral, mas, mesmo que seja um ritual simples, é importante que ele exista.

Tem um outro método simples, mas bastante útil, para responder a perguntas de sim/não, que é descrito pelo Balthazar, do canal Balthazar’s Conjure no YouTube (agora BLTHZR), neste vídeo aqui. Você elabora a sua pergunta, então tira dois arcanos maiores, um para a posição de “sim”, outro para a posição de “não”, e vê qual tem o valor numérico maior. Isso já permite responder um sim/não de forma direta e aí você interpreta os significados das cartas para ter mais nuances, puxando para o positivo no caso da carta “sim” e negativo para o “não”. Se o resultado for não, você também pode tirar mais cartas para entender o porquê e pedir conselho. Outras tiragens clássicas e famosas com as quais você pode começar a praticar, depois de dominar os arcanos menores, incluem a Mandala Astrológica, a Cruz Celta e o Templo de Afrodite, que são muito úteis de se ter no seu repertório.

Nesse momento inicial é importante que você jogue com frequência. O tarô só se aprende de verdade jogando. Não o reserve apenas para decisões importantes, do tipo “devo pedir demissão do meu trabalho?”2. Nesse estágio você está criando uma relação com o baralho e refinando o seu entendimento, por isso é melhor reservar as perguntas sérias para depois que pegar confiança. Tenha um caderninho para anotar as tiragens e conferir depois, que assim você pode confirmar as previsões. E lembre-se sempre também de limpar a si mesmo e o baralho.

5º passo — Aprofundar-se

Depois de ter tido esse primeiro contato e criado uma familiaridade com o tarô, pode ser interessante você levar seu jogo para o próximo nível. Experimente com técnicas mais avançadas (o pessoal da Quareia tem um .pdf, neste link, com várias tiragens mais complexas, algumas das quais foram elaboradas especialmente para magistas) e pense nas possibilidades também de magia com o tarô (mas, para isso, tenha um segundo baralho, pelo menos).

É nesse momento também que eu acho uma boa ideia procurar um curso, por exemplo3. “Mas, Frater, se é para você me falar para procurar um curso, então por que fez este texto?” Bem, da minha perspectiva, o seu aproveitamento de um curso de tarô vai ser melhor se você já chegar com alguma familiaridade com as cartas, porque assim é possível absorver as informações mais profundas sem ficar com a cabeça sobrecarregada com o excesso de novidades. Além disso, seu professor também não vai escolher o seu baralho por você – essa parte é responsabilidade sua.

Porém, a mensagem que é importante se derivar disso é, assim como magia só se aprende fazendo, a única forma de se aprender tarô é jogando. E aí se ficar postergando – “ah, vou esperar para fazer esse curso aqui em novembro”, “vou só terminar de ler esse livro”, “vou esperar baixar o preço desse baralho que eu acho bonito” – você só vai atrasar o seu aprendizado nesse campo. Então, se você estava esperando um sinal para começar, que seja este texto.

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  1. Uma outra característica marcante do RWS é trocar a ordem tradicional dos arcanos A Força e A Justiça, respectivamente 11 e 8, que passam a ser 8 e 11. O motivo para isso, até onde eu entendo, diz respeito às correspondências astrológicas do baralho. Há ainda tarôs que se baseiam no RWS para quase todas as outras questões, mas mantêm a ordem original nesse caso. ↩︎
  2. Aliás, uma dica importante é evitar perguntas do tipo “devo x?” e reformulá-las em termos de “será benéfico para mim se x?” ou “o que devo saber a respeito de x?”, para não negar a sua própria responsabilidade nas suas decisões… mas, enfim, como formular boas perguntas é assunto para um texto à parte. ↩︎
  3. Para quem precisa de uma recomendação nesse sentido, o meu amigo e tarólogo Ricardo Baratela, do Via Lunar Tarot, tem um grande domínio do assunto e oferece com alguma frequência seus cursos de tarô. Também recomendo imensamente o trabalho da Sara, também taróloga e professora de tarô. Confiram o perfil dela no Instagram e o seu canal no Telegram. ↩︎
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